"Viajar? Para viajar basta existir.
Vou de dia para dia , como de estação para estação,
no comboio do meu corpo, ou do meu destino,
debruçado sobre as ruas e as praças, sobre os gestos e os rostos,
sempre iguais e sempre diferentes,
como , afinal, as paisagens são.
Se imagino, vejo. Que mais faço eu se viajo?
Só a fraqueza extrema da imaginação justifica
que se tenha que deslocar para sentir.
(...)
É em nós que as paisagens têm paisagem.
Por isso, se as imagino, as crio;
se as crio, são; se são, vejo-as como as outras.
Para que viajar?
Em Berlim, na Persia, na China, nos Polos ambos,
onde estaria eu senão em mim mesmo,
e no tipo e género das minhas sensações?
A vida é o que fazemos dela.
As viagens são os viajantes.
O que vemos, não é o que vemos, senão o que somos."
(2 - 51, dact.)
Livro do Desassossego, Bernardo Soares
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