quinta-feira, setembro 18, 2003

Cheira-me a cores...

E apaga-se o olhar. A solidão não tem cheiro, não se inspira o perfume do desvanecimento. Porque num dia são cores e sabores e há outro dia em que tudo se esmorece. Desmorona. Desvanece.
Ou se preenche o silêncio dos pensamentos com múltiplos afazeres que aparentemente (ou talvez não) trazem um sopro de realização pessoal ou...nada feito. Apaga-se o olhar. Instala-se a apatia. Melancolia. Rotina. Monotonia. E angustia o cruzamento com um olhar apagado, sem expressão de vida.
E isso perturbou-o. Naquela manhã cinzenta, única como todas as manhãs cinzentas, não subiu a montanha. Ouve o nevoeiro, saboreia a brisa lentamente, mastigando-a devagar...
Isso perturba-o. São vazios, os inúmeros olhares com que se cruza. Tantos como noutro dia qualquer, como naquele, em que o nevoeiro se abateu sobres as suas forças e lhe exigia uma fluidez de raciocínio inimaginável.
Os olhares apagados são o fruto do desencanto, o fruto da queda abismal de sonhos que voaram livremente, elevando-se demasiadamente...Olha à tua volta!
Um jovem (diziam os outros, os que sabiam ou queriam quantificar a vida na ridícula balança do tempo)...
Antes um olhar apagado que um olhar triste, pensava...Talvez não.
Olhares fugidios, preocupados, fingidos, atormentados, ansiosos. A procura incessante da serenidade...era isso que ele detectava. E que o incomodava. Refugiado nos seus pensamentos idealistas, insistia consigo mesmo que a estratégia de princípios existiria e a fórmula milagrosa da tranquilidade aguardaria algures pela sua extraordinária descoberta. Sim. Inquietude. Valsas.
Olhares vazios são rasgos de impessoalidade.
Até que um sorriso, uma expressão, um gesto, uma pequena insignificância (será?) transforma um dia previsível num sopro tremido de algo inacabado. Ressuscita a esperança. E esse retorno dá-se na simplicidade. E só nela. Autenticidade. Força. E tudo volta a ganhar cor...cheiros...sabores...vida...
Aí sim...cheira-me a cores...